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Jacaré-de-papo-amarelo está em risco no Rio de Janeiro

( O alerta é do Instituto Jacaré e da ONG EcoCaiman)

No Rio, o sistema Lagunar de Jacarepaguá abriga uma fauna bem diversificada: aves variadas, algumas migratórias, capivaras, mãos peladas, lontras e algumas espécies mais resistentes como tilápias (exótica). Entre as espécies, temos o jacaré-de-papo-amarelo vivendo entre o lixo e o esgoto, carente de políticas públicas que o defenda.

Uma população de crocodilianos ameaçada por péssimas condições ambientais, pela caça ilegal e pela falta de educação ambiental dos que habitam no entorno das lagoas. Moradores jogam comida, lixo e animais mortos, alterando totalmente seus hábitos alimentares e costumes.

Há descaso público, falta de respeito por parte dos residentes e condições inóspitas por despejo de esgoto. A resiliência dos crocodilianos é de espantar, mas especialistas afirmam que já não são tão numerosos.

Ricardo Freitas tem paixão pelo trabalho com os crocodilianos

Quem trabalha há quase duas décadas com esses animais é o biólogo Ricardo Francisco Freitas Filho, através do  Instituto Jacaré e da Ong EcoCaiman, responsáveis pelo manejo, conservação e resgate de vida selvagem. É um trabalho também de resiliência, pois tentam há alguns anos estabelecer, sem sucesso, uma parceria público-privada para melhor cuidar da sobrevivência dos jacarés.

– Apesar de ser uma espécie resistente aos nossos impactos, corre o risco de desaparecer. Hoje, a população está desequilibrada. A quantidade de indivíduos machos e fêmeas não é equitativa. A poluição altera o nascimento de fêmeas, por causa das altas temperaturas das águas. O aumento de matéria orgânica, aumenta a taxa de decomposição, e a decomposição gera energia e a energia gera calor. A água é quente porque tem muito cocô – explica o biólogo Ricardo Freitas.

Evitar jogar lixo e comida

O apelo dos biólogos é para que a população não lance lixo nem comida nas lagoas. Tal hábito acarreta a concentração de jacarés em determinadas áreas e aumenta as disputas por comida. Um exemplo dessa concentração é o Canal das Tachas, no Recreio dos Bandeirantes.

– Ao atirarem lixo, comida e até seus pets mortos, as pessoas condicionam os crocodilianos a se concentrarem em certos locais. Esse jacaré não é para viver concentrado e a aglomeração ocasiona muitas disputas por território. Temos muitos jacarés mutilados por outros jacarés, sem patas traseiras ou dianteiras, cegos, sem cauda e sem pedaço de mandíbula- ressalta o biólogo.

O trabalho dos biólogos do Instituto Jacaré e da ONG EcoCaiman consiste em capturar, classificar, marcar ( todos os animais estão marcados), medir, pesar e realizar exames importantes para ampliar os conhecimentos sobre o jacaré -de- papo-amarelo – que medem em geral entre 2,5( fêmeas)  e 3,5 (machos) metros de comprimento.

Importância dos crocodilianos para o meio ambiente

O jacaré-de-papo-amarelo, segundo o biólogo, é um predador generalista. Ele mantém o equilíbrio da comunidade biológica e a biodiversidade local. “Esta  espécie consegue um efeito chave na natureza, pois a saturação de uma espécie pode levar ao desequilíbrio de outras”, diz.

Ressalta que as necessidades dessa fauna são desconsideradas pelo poder público que não investe em pessoal qualificado nem faz parcerias para cuidar melhor dos crocodilianos. O resgate deles das áreas urbanas não segue a um protocolo de acordo com análises técnicas. “Qualquer animal resgatado  em área urbana, no Estado,  é jogado em Jacarepaguá. temos aqui até jacarés de Niterói”, afirma Ricardo Freitas.

O Instituto Jacaré é uma empresa que tem a ONG EcoCaimã para manter os projetos de pesquisas e de conservação. Quem deveria cuidar dessa fauna é a Secretaria Municipal de Meio Ambiente -SMAC- (que não respondeu à solicitação de entrevista).  Segundo Ricardo Freitas, o Instituto apresentou uma proposta de cooperação técnica à Secretaria para treinamento e capacitação de pessoal, tornando o trabalho de resgate da fauna mais especializado, no entanto nenhuma resposta foi dada até o fechamento desta reportagem.

– As parcerias público-privadas são importantes para tornar o Rio uma referência no resgate de fauna silvestre. São Paulo está a mil anos luz da cidade nessa questão. É muito importante trocar ideias em prol da qualidade do trabalho, ressalta.

Os estudos não param

Formado pela Universidade Estácio de Sá, Ricardo Feitas tem no currículo mestrado e doutorado e foi pioneiro no Rio de Janeiro a estudar essa fauna. É reconhecido pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), que reúne especialistas no mundo que trabalham com crocodilianos.

– Aqui no Estado do Rio, tenho o privilégio de fornecer informações sobre os jacarés-de-papo-amarelo para eles, afirma

Os jacarés são sua paixão e seu plano agora é fazer pós-doutorado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Pretende se aprofundar nos padrões de saúde do animal, em função da variação de metais pesados. Quer saber o quanto é assimilado e prejudicial para os crocodilianos e conhecer mais sobre a diversidade genética dessa população. “Temos as amostras das escamas, aí complementarei as informações sobre os jacarés-de-papo-amarelo no Rio de Janeiro, conclui.

Conheça o jacaré-de-papo-amarelo

Em condições normais podem ultrapassar dos 70 anos de idade. São encontrados em países da América do Sul como Argentina, Bolívia, Paraguai, Uruguai e Brasil. Aqui, o jacaré-de-papo-amarelo (Caiman Latirostris) ocorre naturalmente nas bacias de São Francisco e do Paraná.  Vivem em áreas alagáveis como brejos, mangues, pântanos, onde tomam banhos de sol.

Mais de 70% de sua distribuição foi registrada em terras brasileiras, em uma extensão de ocorrência que supera os 2,6 milhões de km². A coloração dos animais varia entre verde-oliva e marrom escuro. Possuem pernas curtas, patas com unhas grandes, focinhos curtos, largos e que produzem uma mordida forte. Sua alimentação consiste em peixes, mamíferos, crustáceos, moluscos, aves e répteis de pequeno e médio porte.

Texto: Sandra S. Peleias

Fotos: Instituto Jacaré e ONG EcoCaiman

@institutojacare