Sistema Lagunar de Jacarepaguá: poluição fora de controle

Texto: Sandra S. Peleias/Fotos: Moscatelli/OlhoVerde

Quem passa pelas Avenidas Abelardo Bueno e Salvador Allende, sentido Recreio dos Bandeirantes, Rio de Janeiro, sofre com o forte mau cheiro que exala da Lagoa de Jacarepaguá. Os moradores dos condomínios da região desfrutam de uma bela vista, porém, ignoram os impactos causados ao meio ambiente pelo crescimento desordenado da região.

As ações governamentais, segundo especialistas, são incipientes ainda para conter o despejo clandestino de esgotos e o lixo jogado por habitantes de prédios de luxo e de habitações populares. A Comlurb recolhe o lixo dos residentes nas ilhas (são sete), o Instituto Estadual do Ambiente (INEA) mantém ecobarreiras, no entanto, a limpeza das margens e dos manguezais fica a cargo mesmo dos trabalhos de recuperação ambiental ou de mutirões.

            “Há ainda fragmentos de brejos, restingas e manguezais em diferentes estágios de degradação e sua respectiva fauna residual, tal como uma variedade de aves, algumas migratórias; capivaras, jacarés, mãos peladas, lontras e algumas espécies mais resistentes como tilápias (exótica)”, conta o biólogo Mário Moscatelli, que mantém o projeto OlhoVerde e está sempre monitorando o Sistema Lagunar de Jacarepaguá.

Animais convivem com o lixo e águas fétidas (foto: Sandra S. Peleias)

As consequências desse crescimento desordenado são a supressão de vegetação nativa, o lançamento de esgoto sem tratamento ( das áreas nobres e populares), diz Moscatelli. Sobre o aporte de lixo, ressalta que foi reduzido, porque o Governo do Estado instalou ecobarreiras nos principais rios da região. Grave, também, é o grande volume de sedimentos que assoreiam e sufocam as lagoas, principalmente a da Tijuca.

            -A Comlurb está relacionada com a coleta de lixo nas ilhas do sistema lagunar, sendo que a limpeza das margens das lagoas não existe por conta do poder público, ou apenas em caso de mortandade de peixes. A limpeza das margens e dos manguezais fica por conta dos trabalhos de recuperação ambiental ou de mutirões, acrescenta o biólogo

Processo de degradação

O biólogo lamenta o fato de o poder público ter desperdiçado a chance, durante os Jogos Pan Americanos e Olímpicos, de virar a mesa da degradação, “mas, praticamente, nada fez”.  Acrescenta que o passivo existente é fruto da falta de vontade política em resolver os problemas pelo menos desde a década de oitenta, quando o processo de degradação se acentuou. “De lá para cá, muito se falou e quase nada se fez, como é de praxe nesse país quando o tema é ambiental”.

“O sistema lagunar ainda passa por renovação de suas águas, mas é insuficiente para dar conta do despejo de esgoto generalizado na bacia hidrográfica local que foi transformada numa imensa rede de rios e canais de esgoto e lixo”, informa Moscatelli.

            -O sistema lagunar para ser revitalizado, precisará ser dragado, visto que além da perda da biodiversidade existente também há o problema de drenagem das águas pluviais. Caso não seja resolvido, teremos o agravamento das inundações na região.

Explica que não faltam órgãos responsáveis:  INEA, A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMAC) e até o Instituto Brasleiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA). Também podem operar o Ministério Público Estadual (MPE) e o Ministério Público Federal (MPF), além da delegacia de meio ambiente. Ou seja, para ele, não é por falta de gente que medidas apropriadas não são tomadas.

-O projeto no qual estou envolvido está relacionado inicialmente com a recuperação das margens da laguna do Camorim, principal corredor entre os maciços da Pedra Branca e Tijuca.

Moscatelli estima que o esgoto de pelo menos meio milhão de pessoas vai para rios, para as lagoas e para a praia sem tratamento. “Destaco que é uma estimativa otimista. Só a favela Rio das Pedras despeja o esgoto de aproximadamente 70.000 pessoas nas águas da lagoa da Tijuca. Portanto, imagine o resto”.

O que deve ser feito pelo poder público? “O poder público é responsável pela ordenação do solo e pela fiscalização dos delinquentes ambientais, por isso deve exigir o cumprimento das leis ambientais, simples assim”.

-Da mesma forma que sou obrigado a pagar os impostos de serviços que eu não recebo, as autoridades deveriam ser obrigadas a cumprir as leis ambientais bem como o zoneamento do uso do solo municipal. Infelizmente, a regra virou exceção e vice-versa, por conta de fatores culturais, típicos de colônias de exploração do século XXI, bem como da falta de massa crítica da sociedade que aceita praticamente tudo, devido ao que eu chamo de resiliência patológica.

Para finalizar, o biólogo chama a atenção para a importância da educação, porque enquanto “não houver massa crítica diante dos desmandos, não haverá “solução duradoura”. Acredita que a privatização da Cedae traga alguma melhoria para o sistema lagunar, já que, antes, a companhia “tinha como único objetivo a arrecadação e por isso chegamos a esse ponto, com lagoas e baías transformadas em latrinas”

– Pior é saber que os responsáveis históricos por essa degradação sistêmica estão por aí, livres, leves e soltos como não poderia deixar de ser numa colônia de exploração.

Saneamento básico é atribuição dos municípios, diz INEA

O Instituto Estadual do Ambiente (INEA) informa que atua na região com a operação de cinco ecobareiras instaladas na foz de rios que  deságuam nas lagoas da Barra da Tijuca e de Jacarepaguá: Rios Arroio Pavuna, Pavuninha, do Anil, no afluente do Rio Arroio Fundo e no Itanhangá.  O objetivo é reter resíduos sólidos flutuantes e plantas aquáticas impedindo-os que cheguem aos ecossistemas lagunares e, consequentemente, na praia da Barra. As estruturas retiveram, de dezembro de 2020 até 21 de outubro de 2021, 4.200 toneladas de resíduos que foram encaminhados para aterros sanitários devidamente licenciados, diz a nota do INEA.

O órgão ambiental estadual informa ainda que “o saneamento básico é atribuição dos municípios e da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) que, com a privatização da mesma, ficou a cargo da empresa que ganhou o lote da área”.

As Lagoas

O complexo lagunar é formado pelas lagoas da Tijuca, Jacarepaguá, Marapendi, e a de Camorim ( esta situada entre as lagoas da Tijuca e de Jacarepaguá). O divisor de águas da bacia de drenagem do sistema é estabelecido pelas linhas da crista dos Maciços da Pedra Branca e da Tijuca. Com cerca de 280 Km² de área, a bacia hidrográfica do complexo lagunar de Jacarepaguá é composta por diversos rios que descem as vertentes dessas montanhas e deságuam nas lagoas, que por sua vez se ligam ao mar pelo canal da Barra da Tijuca (ou canal da Joatinga), permitindo a troca de água com o mar.

Onde a Comlurb recolhe o lixo?

A Comlurb informa que recolhe o lixo nas sete ilhas do sistema e todas têm pontos de coleta junto aos decks. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMAC), embora solicitada a responder sobre as ações desenvolvidas na região, até o momento não enviou nota para o blog. Mas, caso responda, a matéria será atualizada.

5 comentários em “Sistema Lagunar de Jacarepaguá: poluição fora de controle”

  1. Com tanto órgão responsável e ninguém faz nada? Talvez porque não dê voto e a população também não cobra (e não entende que a degradação afeta todo mundo). Aí passam mais 4 anos de empurra-empurra e mais governantes sem compromisso são eleitos. E mais um ecossistema é destruído. Absurdo.

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